segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O cinema que nos une: as co-produções entre Portugal e Espanha


A primeira co-produção de que se tem conhecimento remonta ao ano de 1924, quando o realizador português Reinaldo Ferreira dirige em Espanha o filme "El Botones del Ritz". O filme foi inteiramente filmado em Lisboa, embora seja protagonizado apenas por actores espanhóis.

Dez anos depois, em 1934, a imprensa especializada fala da constituição de um consórcio Luso-espanhol de produção de filmes entre a Ibérica Filmes de Barcelona, e o bloco H. da Costa de Portugal. O contacto dessa relação era Arthur Duarte, contratado como assistente geral de produção da Ibérica Filmes. 


Esta colaboração tinha como objectivo ajudar os técnicos portugueses a aprenderem. O único filme que coincide com estas características, é a produção da Ibéria Filmes "Una Semana de Felicidad" realizada por Max Nossech, e entre os seus interpretes pode-se encontrar os portugueses Tony D'Algy (como protagonista) e o próprio Arthur Duarte.

Arthur Duarte (creditado como Arturo Duarte) continuou colaborando com a produtora espanhola, aparecendo o seu nome como ajudante de realização e actor (num papel secundário) no filme "Aventura Oriental", igualmente realizado por Max Nosseck em 1935.

(Leitão de Barros)

Arthur Duarte também será ajudante de realização na seguinte colaboração entre ambos os países, "Bocage/Las Tres Gracias", filme realizado por Leitão de Barros para a produtora espanhola Hispano-Portugués e para a portuguesa Sociedade Universal de Superfilmes.

Este filme terá duas versões, uma protagonizada apenas por portugueses e outra só por espanhóis. As duas versões serão igualmente filmadas nos estúdios da Tobis Portuguesa em Lisboa. A versão portuguesa terá sua estreia em 1 de Dezembro de 1936. Uma das finalidades das duas versões será a sua exportação para o mercado Hispano-americano. O filme alcançará um enorme êxito no Brasil, ao se estrear em meados de 1937. O mesmo êxito terá em 1938 ao se estrear na Argentina no dia 22 de Novembro. Invulgar será dizer que em Espanha o filme só terá sua estreia em 4 de Março de 1940.


Leitão de Barros, já em 1930, no período de introdução do cinema sonoro, advogava um cinema nacional com versões espanholas, procurando dessa forma atingir “todos os povos de língua portuguesa e espanhola, ou sejam Portugal, Brasil, Espanha, América Latina e as respectivas colónias”

Todavia, foi só nos inícios dos anos quarenta, em plena Segunda Guerra Mundial, que, no seguimento das iniciativas particulares, parece existir a procura de um acordo político formal de co-produção cinematográfica entre as duas nações ibéricas.

(Arthur Duarte)

Deste modo, em Janeiro de 1941, Manuel Garcia Viñolas, o responsável pelo Departamento Nacional de Cinematografia espanhola, encontra-se com António Ferro (director do Secretariado de Propaganda Nacional/SPN), ficando assente “o estudo imediato de todas as possibilidades de trabalho em comum e de permuta cinematográfica entre Portugal e Espanha”, que será “submetido à aprovação dos dois Governos e de que resultará um acordo de altíssimo alcance e importância”

Em finais de 1943, começa desta forma uma colaboração cinematográfica contínua, sucedendo-se as co-produções ou, pelo menos, as versões em ambas as línguas: o húngaro Ladislau Vadja, radicado em Espanha, assina a realização de O Diabo são Elas”, “Três Espelhos” ou “Viela – Rua Sem Sol”, enquanto Arthur Duarte filma em Madrid “Es Peligroso Asomarse el Exterior”, “El Huesped del Cuarto Trece” e “Fuego 218”.


Nas palavras de Leitão de Barros, em entrevista dada ao Diário Popular em 11 de Dezembro de 1944: “Tanto Portugal como a Espanha ganham com a iniciativa de fazer filmes destinados aos dois mercados de antemão garantidos”.

Apesar de terem existido vários filmes produzidos neste sistema, poucos mereceram o apoio estatal, excepção feita a “Inês de Castro” (1945), de Leitão de Barros, uma co-produção apoiada por António Ferro, através do SPN, e por Garcia Viñolas, pelo Departamento Nacional de Cinematografia Espanhola.


Para Maria do Carmo Piçarra, este era o filme através do qual Ferro e Viñolas “esperavam que a então apregoada Irmandade Ibérica viesse a traduzir-se num acordo político de co-produção cinematográfica”. Contudo, apesar da estreia de gala, no S. Luís, com a presença do Presidente da República, e de em Espanha ter sido considerado de interesse nacional, a verdade é que o filme não produziu o efeito político esperado, de criação de um regime concertado de co-produções, e a cooperação contínua, mas em moldes puramente particulares.

Esta colaboração, que trouxe uma certa actividade aos estúdios portugueses, termina por volta de 1949, quando a indústria deixa de ter dinheiro, apesar da lei que entretanto saíra, e quando a Espanha, “à medida que ia entrando noutros mercados, [se desinteressou] dessas versões duplas para Portugal”.



De referir ainda as obras portuguesas de realizadores espanhóis experimentados, mas de segunda categoria, como “Cais do Sodré” e “Os Vizinhos do Rés-do-Chão” (ambos filmes portugueses do realizador espanhol Alejandro Perla), “A Mantilha de Beatriz” e “Não há Rapazes Maus” (de Eduardo Maroto, sendo o segundo uma produção portuguesa e o primeiro uma co-produção), “Sol e Toiros” (produção portuguesa do realizador José Buchs), “Senhora de Fátima” e “Rainha Santa” (de Rafael Gil, sendo o primeiro uma produção espanhola e o segundo uma co-produção).

O intercâmbio português também se cifrou na passagem para Espanha de diversos actores portugueses, como Milú, António Vilar, Virgílio Teixeira ou Raul de Carvalho.


Rino Lupo

Ainda no tempo do cinema mudo, “Os Lobos” (1923), produzido e dirigido pelo cineasta italiano Rino Lupo, foi exibido com relativo êxito, não só em Portugal, como também na França, no Brasil, na Itália, na Espanha e na Romênia.  Rino Lupo rodou no Porto o primeiro filme galego, “Carmiña, Flor de Galicia” (1926).



Fontes/Mais informações:  Fotblog de Paulo Borges (1)(2) / Tese de Carla Patrícia Silva Ribeiro “O alquimista de sínteses – António Ferro” / O cinema que nos une. As co-produções na Península (Alejandro Pachón) / Panorama do Cinema Espanhol (Cinemateca, Luís de Pina, José de Matos-Cruz) / Salazar vai ao cinema (Maria do Carmo Piçarra) / Enciclopédia do Cinema Espanhol /Blog Do Porto e não só /  Blog Filmes Portugueses

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