sábado, 31 de março de 2012

J. Rentes de Carvalho: entre a Holanda e Portugal


Nascido em Vila Nova de Gaia em 1930, de ascendência transmontana, foi obrigado por razões políticas a abandonar Portugal, tendo vivido em Paris e largas temporadas no Brasil. Entretanto, um amigo, adido comercial da embaixada do Brasil na Holanda, precisou de ajuda para dirigir uns relatórios. "Respondi-lhe que iria duas semanas no máximo. Fiquei 55 anos."

Depois da experiência como assessor na embaixada, andou a vender revestimentos para telhados. "Foram três anos muito duros."

Na época conheceu um professor catedrático que dirigia um curso de literatura portuguesa na Universidade de Amesterdão. "Tinha aprendido português na Indonésia e escrevera uma tese sobre Fernando Pessoa. Já tinha uns 60 anos e conversávamos muito sobre literatura e Portugal. Um dia, disse-me: ‘você não é dos telhados, mas da universidade’".

Assim começou a dar aulas sem ser licenciado. Em cerca de dois anos deu por findo o curso com a tese "O Povo na Obra de Raul Brandão". Ali leccionou até 1988.


Principal bibliografia (1972)

A sua bibliografia inclui romances (entre eles "Montedor", 1968, "O Rebate", 1971, "A Sétima Onda", 1984, "La Coca", 1992, "Ernestina", 1998, "A Amante Holandesa", 2003), contos, diário ("Tempo Contado" - nome do seu blog - ou "Tempo sem Tempo"), crónica ("Mazagran", 1992) e guias de viagem. O seu "Portugal, een gids voor vrieden" ("Portugal, Um Guia para Amigos"), de 1988, esgotou dez edições.

"Com os Holandeses" ("Waar die andere God woont", publicado originalmente em neerlandês, em 1972, e um sucesso editorial na Holanda) é a primeira obra de J. Rentes de Carvalho no catálogo da Quetzal.

O mais recente título de Rentes de Carvalho é "Gods Toorn over Nederland" ("A Ira de Deus sobre a Holanda").

"Com os Holandeses" (1972)


Um dos grandes temas de Rentes de Carvalho teve como base a observação da vida dos holandeses. O ponto de partida foi o seu famoso "Waar die andere God woont" de 1972, traduzido para português com o título "Com os holandeses".

Na Holanda já vai na 13ª edição, a Portugal só chegou em 2009.

Luís Carmelo escreveu, nessa altura, que é "pena é que Portugal não tenha tido, no último meio século, nenhum escritor estrangeiro que tivesse dado do país o retrato tão corrosivo e objectivo como o que Rentes de Carvalho generosamente concedeu à Holanda. Apesar de algumas farpas estimulantes e certeiras do amigo holandês Gerrit Komrij (e do seu ainda actualíssimo "Um Almoço de negócios em Sintra").


Um desconhecido em Portugal durante muitos anos

José Rentes de Carvalho vendia milhares de livros na Holanda, mas isso não fazia dele alguém conhecido em Portugal.

As suas primeiras editoras em Portugal publicaram os seus livros sem jamais prestarem contas, pelo que optou por publicar os seus livros na Holanda, ainda que os escreva em Português e na sua maioria tenham mais de Portugal do que da Holanda, mas por razões insondáveis também nunca nenhum editor português tomou nota da sua existência.

Episódio curioso e sintomático desse desdém passou-se em 1989, durante a Buchmesse de Frankfurt. O editor holandês decidiu que o stand inteiro da editora seria quase inteiramente dedicado aos seus livros. Fora e dentro do stand foram colocadas várias fotografias do autor, com o nome em bom tamanho, e fotografias das capas, tudo em formato de cartaz.


Durante três dias passaram por lá dezenas de editores, funcionários da cultura e jornalistas portugueses. O escritor viu alguns a pararem embasbacados, mas não houve um único com curiosidade de saber quem era o compatriota, ou por que razão o exibiam ali.

Leonardo de Freitas, o patrão da Editorial Escritor, escreveu-lhe em fins de 1997 a dizer que gostaria de editar os seus livros, o que aconteceu até meados da primeira década do Século XXI.

Actualmente, com a Quetzal a relançar a sua obra em Portugal, José Rentes de Carvalho diz-se com “o coração cheio”.


Holandeses e Portugueses

Dos holandeses bem nos falta o afinco ao trabalho e ao estudo a sério, a consciência social, a disciplina, a pontualidade.

Para a Holanda poderíamos certamente exportar aquela nossa forma de carinho que, mesmo quando não é sincera, sempre dá um certo conforto à alma.

E poderíamos ensinar os holandeses a comer. Há aqui excelentes restaurantes, mas a culinária doméstica é de fugir dela a sete pés.

Um pouquinho do nosso "deixa lá" também compensaria da rigidez calvinista.


Outras curiosidades

Até recentemente desconhecido do grande público português, é actualmente considerado um dos autores mais inovadores e inteligentes da prosa escrita em língua Portuguesa.

Para a editora De Arbeiderspers, de Amsterdam, dirigiu e escreveu os posfácios da edição em língua holandesa das principais obras de Eça de Queiroz.

A sua biobibliografia acha-se incorporada desde a 9ª edição na Grote Winkler Prins Encyclopedie, a mais antiga (1870) das enciclopédias holandesas.

Fontes/Mais informações: Eito fora / jornal i / Página oficial / wikipedia / DN / Blog Tempo Contado / Up Magazine (TAP)/ Pnet Literatura / Bert Ernste / Quetzal

1 comentário:

Blogger disse...

Retour a Lisbonne do francês Max Alhau

http://www.ofigueirense.com/seccao.php?id_edi=278&id_sec=2