quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Portugueses na literatura norte-americana

(...) são poucos os escritores canónicos norte-americanos que incluem personagens portuguesas enquanto os textos produzidos por escritores de segundo e terceiro planos [cujas narrativas praticamente não são lidas nos nossos dias] incluem-nas com maior frequência. (...)

Esta situação cria a ilusão de que os portugueses estão arredados das narrativas norte-americanas – excepto em alguns textos canónicos escritos por Frank Norris, Herman Melville, Edith Wharton, Mark Twain, Jack London e Nathaniel Hawthorne (...).

Olhar distanciado e pouco lisonjeoso

A maioria das vezes, a sua representação ocupa somente algumas páginas em, digamos, romances com cerca de trezentas páginas. Embora este "corpus" seja muito diversificado, a maioria das imagens que lá encontramos, porém, não são nem lisonjeiras nem edificantes para o leitor luso-americano.

O que ressalta destes textos é que a maioria destes escritores norte-americanos optou por um olhar distanciado destes emigrantes portugueses, evitando, deste modo, compreendê-los culturalmente ou simplesmente como um povo. (...)


Cor da pele

(...) [Os] povos da Europa do sul e a sua tez um pouco mais escura provocaram ansiedade e desconforto em determinadas vozes norte-americanas, sobretudo as de origem nórdica europeia. (...)

Esta problemática está presente nos seguintes textos literários: "The Octopus" (1901), de Frank Norris; "Martin Eden" (1909) e "The Valley of the Moon", ambos escritos por Jack London; “The ‘Gees’” (1856), um conto de Herman Melville; "Captains Courageous" (1897), de Rudyard Kipling; “Aunt Foster’s Cranberries” (1904), de John Albert Macy; "The House by the Windmill" (1923), de Agnes Edwards Rothery; "My Son" (1924), de Martha Stanley; "Cranberry Red" (1938), de Edward Garside; "Look to the Mountain" (1942), de LeGrand Cannon, Jr.; e "Hawaiian Harvest" (1933), de Armine Von Tempski.


Alegada violência dos emigrantes portugueses

(...) Podem, inclusivamente, representar uma ameaça para a democracia dos Estados Unidos na medida em que demonstram algum fascínio pela anarquia e os ideais comunistas, tal como o romance de Edward McSorley, "The Young McDermott", publicado em 1949, evidencia.

Estes temas são aflorados sobretudo nos seguintes textos: o conto “The Haunted Window” (1867), de Thomas Wentworth Higginson; o romance "Murder on Cape Cod" (1931), de Frank Shay; "The Lost Weekend" (1944), de Charles Reginald Jackson; “Footfalls” (1946), de Wilbur Daniel Steele; "Evil Under the Sun" (1951), de Anton Myrer e "Against a Darkening Sky" (1943), de Janet Lewis.


Conduta sexual

(...) Embora a sublimação sexual fosse considerada a conduta mais socialmente aceitável, o personagem masculino no conto “Drowne’s Wooden Image,” de Nathaniel Hawthorne move-se no seio destas supostas tentadoras sexuais de maneira a ser sexualmente excitado.

(...) A dinâmica do desejo sexual e a necessidade de contacto físico com o Outro, para além de intemporais, emergem quer em contextos coloniais quer em sociedades multiétnicas. Estas questões são abordadas nos seguintes textos literários: "An Island Chronicle" (1924), de William Cummings; "Sun on their Shoulders" (1934), de Elizabeth Eastman; "February Hill" (1934), de Victoria Lincoln; “Beatrice Palmato” (1935), de Edith Wharton; "Out of the Fog" (1940), de Joseph Lincoln; "Ho, The Fair Wind" (1945), de Ida A. R. Wylie; “The Thinker” (1927) e “For Where is Your Fortune Now?” (1946), de Wilbur Daniel Steele.

Situações cómicas

(...) alguns escritores, sobretudo Mark Twain e John Steinbeck, de quem se esperaria uma abordagem um pouco mais isenta, acabam eles próprios por criar situações cómicas e de gosto duvidoso com personagens portuguesas simples e rústicas estabelecendo, deste modo, um paralelo entre os portugueses e a vulgaridade e imbecilidade.

Estas temáticas são abordadas nos seguintes textos literários: "Isidro" (1905), de Mary Austin; "Water" (1931), de Ruth Comfort Mitchell; "Tortilla Flat" (1935), de John Steinbeck; "The Haunted em Mourning Becomes Electra" (1931), de Eugene O’Neill; "Dust" (1928), de Armine Von Tempski; "After a Hundred Years" (1935), de Ruth Eleanor McKee; "The Sea Fox" (1956), de Scott Corbett; e "The Innocents Abroad" (1869), de Mark Twain. (...)

Fontes/mais informações (texto completo): Reinado Silva (autor de "Representations of the Portuguese in American Literature"/ Portstudies

1 comentário:

Blogger disse...

Subordinada ao tema “A Presença e a Imagem dos Portugueses nos EUA”, na conferência interveio ainda Reinaldo Silva, que emigrou para os Estados Unidos em 1967, com seis anos, fixando-se em Newark.

Reinaldo Silva estudou nos dois países, tendo-se licenciado na Universidade de Coimbra e tirado o Mestrado em Estudos Ingleses e Literatura Americana na Universidade de Rutgers, em Newark.

Para este académico, a imagem dos portugueses nos Estados Unidos depende da época que for considerada.

“A imagem hoje é uma imagem extremamente positiva: de um povo trabalhador, que faz parte e está a produzir cultura, com escritores americanos, de ascendência portuguesa, que escrevem sobre as suas raízes”, sublinhou.

“Mas a imagem de emigrantes portugueses em romances do século XIX, sobretudo a partir da chegada dos emigrantes açorianos, com a actividade baleeira, a imagem dos portugueses que surge em romances americanos é muito negativa”, notou.

Trata-se de um fenómeno extensível a outros grupos étnicos, porque, explicou, “há uma cultura dominante que é branca, anglo-saxónica e protestante”.

“O outro, o desconhecido, é sempre visto como uma ameaça, em que a imagem negativa é feita a partir de estereótipos. Na actualidade, esta imagem diluiu-se com o tempo”, sustentou.