Em 1932, o escritor neerlandês J. Slauerhoff (1898-1936) publicou um romance no qual Macau e Camões surgem como dois dos protagonistas principais.
O romance revela um mundo em decomposição e em conflito, dominado pela animosidade entre chineses e portugueses e é constituído por três linhas narrativas que se entrecruzam e se sobrepõem.
Primeira linha narrativa – história de Macau
Uma primeira relata a história de Macau, desde os acontecimentos que por volta de 1540 levaram à sua fundação até ao início do século XX. A imagem dada segue a linha de ascensão e queda apresentada na obra de C. A. Montalto de Jesus, “Historic Macao. Internacional Traits in China old and new” (1926). (…) Logo após a sua publicação foi proibida e queimada pelas autoridades. Não obstante Slauerhoff adquiriu um exemplar do livro durante a sua primeira visita a Macau.
(…) encontramos no Prólogo que trata da fundação de Macau dois protagonistas chamados Farria e Mendes Pinto e um “remake” do episódio da vingança de António de Farria em resposta à destruição de Liampó pelos chineses como relatado por Fernão Mendes Pinto na sua “Peregrinação”. Slauerhoff baseou-se no resumo do episódio que encontrou em “Historic Macao”.
Segunda linha narrativa – vida de Luís de Camões
Uma segunda linha narrativa descreve a vida de Luís de Camões na corte de Lisboa, a viagem de navio para o desterro, o naufrágio (aqui situado em frente à baía de Macau), um segundo exílio – desta vez para a China - e a travessia pelo deserto chinês. As duas linhas juntam-se quando Camões chega a Macau.
Terceira linha narrativa – vida dum radiotelegrafista
A terceira linha narrativa conta a vida dum radiotelegrafista, que nos anos trinta do século XX se encontra embarcado no Mar da China. O radiotelegrafista apanha sinais misteriosos que mais tarde se mostram ligados à vida de Camões. Através dos sinais, o espírito do poeta consegue tomar conta do do espírito do radiotelegrafista. (…)
Romance simbólico
O que pode parecer um romance histórico é, pelo contrário, um complexo e arrojado romance simbólico que trata da identidade do homem moderno e da questão da inspiração poética. (…)
O texto que preverte “Os Lusíadas” é, ao mesmo tempo, construído à base de fragmentos da obra lírica de Camões, recorrendo a palavras, imagens ou motivos do poeta português. Este é o romance em que Slauerhoff é “possuído” por Camões, de quem, como um vampiro, extrai o canto.
Fonte: “Camões e Macau num romance neerlandês” de Patrícia Couto com Arie Pos (adaptado)
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