(…) Antes de terminar o curso de medicina, [o escritor neerlandês J. Slauerhoff (1898-1936)] fez uma viagem de navio e conheceu o Porto. Da impressão que a cidade lhe causou, restaram um poema “Portugeesch Fort” (“Forte Português”), a vontade de voltar a Portugal e a certeza de querer passar o resto da vida no mar. (…)
“Oost Azië” (“Extremo Oriente”)
[Após embarcar para o Extremo Oriente] Em 1927 publicou um livro de poemas “Oost Azië” (“Extremo Oriente”) que inclui uma secção dedicada a Macau, constituída por cinco poemas: “De Jonken” (“Os juncos”), “Kathedraal S. Miguel” (“Catedral S. Miguel”), “Uitzicht op Macao van Monte af” (“Vista de Macau a partir da fortaleza do Monte”), “Ochtend Macao” (“Aurora Macau”) e “Camoës” (“Camões”).
“Solares”
De Março de 1928 a Fevereiro de 1931 (…) trabalhou como médico de bordo em navios da Lloyd Real Holandesa na carreira Amesterdão-Buenos Aires v.v., com escala obrigatória em Lisboa. Recordações das suas visitas à metrópole encontramos na colectânea de poesia “Solares” (1933), que contém uma secção intitulada “Saudades” onde encontramos poemas com títulos em português: “Lisboa”, “Fado’s”, “Vida triste”, “O engeitado”, “Saudade” e “Fado”.
Obsessão por Camões
Tal como faz de Lisboa e Macau projecções do seu próprio mal-estar, transforma também a figura de Camões. Reconhece nele um poeta maldito a seu modo e transfigura-o da mesma maneira que transfigurou os outros poetas com quem se identifcava, isto é, transpondo para eles as suas próprias obsessões. De todos estes poetas Camões é a personagem mais recorrente na obra de Slauerhoff.
Para além do poema já referido, publicado em “Oost Azië”, incluiu um poema intitulado "Camöes’ thuiskomst” (”Regresso de Camões") numa nova colectânea chamada “Eldorado” (1928).
Em 1932 é editado o seu primeiro romance “Het verboden rijk”, traduzido para português sob o nome “O Reino Proibido”. Aqui uma das duas personagens principais é baseada na figura de Luís de Camões.
Em 1935 é publicado o conto “Laatste verschijning van Camöes” ("A última aparição de Camões”). Neste conto surge novamente o protagonista de “O Reino Proibido”. Poucos meses antes da morte de Slauerhoff ainda foi publicado um outro poema intitulado “Camões”, na colectânea “Een eerlijk zeemansgraf” (“Um honroso jazigo de marinheiro”).
Personagem chamada Luís de Camões (em poemas, romance e conto)
Estamos assim perante um fenómeno curioso: nos poemas, no romance e no conto, Slauerhoff apresenta-nos uma personagem chamada Luís de Camões que é uma versão transfigurada da personagem histórica.
Dá-se, portanto, o caso algo contraditório de Slauerhoff denotar uma quase-obsessão pela figura de Camões, ao passo que a figura que apresenta tem pouco a ver com o verdadeiro Camões, mas pelo contrário muito mais com o próprio Slauerhoff.
Fonte: “Camões e Macau num romance neerlandês” de Patrícia Couto com Arie Pos (adaptado)
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