sábado, 15 de setembro de 2018

O Brasil e o Fado com "Foi Deus" de Alberto Janes


Estávamos no início dos anos 50 e Amália era já uma artista consagrada, reconhecida internacionalmente como a maior intérprete do Fado, quando Alberto Janes, então um desconhecido, decide um dia deslocar-se a Lisboa com o objectivo de lhe oferecer as suas composições.

Ao chegar a casa de Amália, Janes conta-lhe que era farmacêutico e que tinha uma farmácia em Reguengos de Monsaraz, de onde era natural, mas a sua paixão era a música e o seu sonho era ser artista. Quem rodeava Amália nesse dia teve uma opinião negativa acerca de Alberto Janes … que era um desconhecido, que a música dele não dava para Amália cantar, etc…


Amália ouviu-o atentamente e reconheceu-lhe um talento invulgar, decidindo naquele mesmo instante comprar uma das suas músicas, o célebre "Foi Deus", que viria a ser gravado em Londres nas históricas sessões de Abbey Road, transformando-se num êxito imediato em 1953. Seguiram-se outros tantos trechos, o célebre "Vou dar de beber à dor", o "É ou não é", o "Il mare é amico mio", o "Caldeirada", temas que - tal como Amália vaticinara - seriam sucessos em qualquer parte do mundo.

Escrito propositadamente para Amália Rodrigues, "Foi Deus" rapidamente se tornou indissociável da personalidade musical desta intérprete. Nos seus versos, o compositor exprimiu com felicidade a sua profunda admiração pela Diva do Fado ao atribuir o talento de Amália a uma criação divina, comparável com os milagres da natureza.


Regravada e cantada por tantos fadistas ao longo destes mais do que sessenta anos, obteve igualmente um grande sucesso no Brasil.

As primeiras versões no Brasil foram de cantores portugueses aí radicados como Olivinha Carvalho e Alberto Ribeiro, ambos em 1955, e Ester de Abreu em 1956, que gravaram "Foi Deus" no seu estilo original de fado.

A primeira versão, em estilo mais livre, foi da autoria da cantora gaúcha Cândida Rosa que gravou em 1959 o fox-canção (ou fado-canção) "Foi Deus" (tendo como lado b a sua versão de "De Degrau em Degrau").
 

 

No entanto é no começo dos anos 60 que "Foi Deus" se torna (ainda) mais conhecida no Brasil ao ser gravada por Ângela Maria, que era a cantora mais popular da época no Brasil, num estilo beguine ou fado com arranjo abolerado.

À gravação de Ângela Maria em 1962 seguiram-se recriações por muitos outros artistas brasileiros como Iraquitan, em 1963, Francisco Egydio em 1964, Agnaldo Timóteo, em 1968, Nelson Gonçalves (terceiro maior vendedor de discos da história do Brasil, no seu álbum "Só Nós Dois" de 1970), Rosinha Valença, em 1975, Fagner, em 1991, Agnaldo Rayol, em 1998, Emílio Santiago, em 1998, Roberta Miranda (no seu álbum "Tudo Isto É Fado" de 1991), ou Cauby Peixoto (a solo e em dueto com Ãngela Maria em 1977 e com Selma Reis em 2013).


Um dos maiores sucessos de 1963 no Brasil foi a versão de "Foi Deus" pela cantora portuguesa, radicada no Brasil, Gilda Valença, irmã de Ester de Abreu.

O tema foi incluído no álbum "Marcha Rancho - Um Toque Brasileiro Nos Grandes Sucessos de Portugal", no qual sucessos da música portuguesa foram gravados com arranjos de marcha rancho e acompanhamento da Lira do Mestre Lula e Grupo de Coristas.


"Foi Deus" foi igualmente gravado pela cantora espanhola Maria Dolores Pradera, em 1968, no seu disco “Maria Dolores Pradera canta a Portugal”,  com acompanhamento à guitarra de Fernando de Freitas e à viola de Amândio Manuel, num disco que incluía também versões de “Lisboa não sejas francesa”, “Mãe preta” e “Primavera” .

Fontes/Mais informações: Aldeia da lusofonia / "Subsídio para o estudo da obra de Alberto Janes" (Tese de Jorge Manuel Neves Carrega) / Museu do Fado / Portal do Fado / Fado Cravo



 

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