segunda-feira, 30 de julho de 2012

Grácia Nasi, uma história de vida


Grácia Nasi, baptizada com o nome cristão de Beatriz de Luna, nasceu em 1510 no seio de uma família de cristãos-novos (marranos) originários de Castela, vinda para Portugal após a expulsão dos judeus de Espanha, em 1492. Entre os convertidos encontrava-se a família de Grácia assim como a do seu futuro marido Francisco Mendes, aliás Semah Benveniste, natural de Sória em Castela.

Seu irmão Agostinho Miguel era médico na corte e leccionava medicina na Universidade de Lisboa. Em 1528, ao 18 anos, Beatriz casou-se com Francisco Mendes, que, junto com seu irmão Diogo Mendes, liderava um império de comércio de pedras preciosas e especiarias, cuja casa bancária tinha sucursais na França e Flandres. Do casamento nasceu uma única filha, de nome de baptismo Ana, a quem chamavam Reina.


Em 1535, Francisco Mendes morre, ficando Grácia e o cunhado, que dirigia a filial em Antuérpia, como gestores de uma imensa fortuna. A Inquisição foi estabelecida em Portugal em 1536 e Beatriz, percebendo o perigo que corria no país, abandona o país, com destino a Antuérpia,  acompanhada da filha, da irmã e de seus sobrinhos Bernado e João Micas (futuro Joseph Nasi), então com 13 anos.

Em 1547 encontra-se em Veneza, porto de abrigo de gente das mais variadas partes do mundo e um expoente de cultura na Europa. Até 1547, o clima é de tolerância para com a comunidade judaica aí residente mas quando, a partir de 1550, o Senado da Sereníssima, renova o decreto de expulsão dos judeus confirmando que não era possível ali permanecer em segurança. A certeza quanto ao perigo que corriam chega em 1553 quando na Praça de S. Marcos são queimados exemplares do Talmude e outros livros judaicos.


Enquanto se fecham as portas de Veneza abriam-se as de Ferrara onde permanece entre 1550 e 1552 onde a corte de Hércules II, Duque d’Este, acolhia a nação hebraica lusitana e espanhola sem olhar à nacionalidade ou religião. Ferrara, seria assim, a última paragem de Dona Grácia na Europa cristã antes de se refugiar definitivamente no mundo muçulmano.

Num momento em que cresciam as perseguições na Europa cristã um outro mundo de esperança se abria na Turquia. Em 1552 embarca para Constantinopla numa viagem que duraria seis meses. A primeira paragem seria Ragusa, um importante porto do Adriático, e Salónica.


                                                             (selo lançado em Israel)

Os dezoito anos em que vive em Istambul, no seu Palácio de Belvedere, junto às margens do Bósforo, são anos tranquilos em que finalmente pode confessar abertamente o judaísmo.

Grácia Nasi morre em 1569. É lembrada por muitos como “Uma das mais nobres mulheres e honrada como uma princesa”, símbolo do “coração do seu povo”, “Glória de Israel” e por aqueles que sempre auxiliou simplesmente como “A Senhora”.


A señora, a dama, Ha-geveret – em hebraico – marcou de uma maneira indelével a cultura judaica. Sua lembrança foi perpetuada através das inúmeras sinagogas que têm o seu nome, entre elas, uma em Esmirna, El Kal de la Señora, sinagoga que foi muito frequentada até 1970

Grácia Nasi é considerada a heroína por excelência do judaísmo, em geral, e do judaísmo sefaradita, em particular. Salvou centenas de marranos da morte e das perseguições. Tentou agir contra o anti-semitismo, impondo um boicote económico. Tentou construir uma pátria judaica na Palestina, tendo Tiberíades como base.

Fontes/Mais informações: Universidade de CoimbraComunidade Judaica de BelmonteÓculos do mundoRevista Luxriototal  /  morashawikipedia / criptojews / redejudiariasportugal / Esther Mucznik

Museu on-line

Versão on-line de "A Senhora" de Catherine Clément


Livros e mais livros

A primeira biografia de Grácia Nasi foi escrita por uma mulher, Alice Fernand-Halphen, em 1929, na Revue de Paris sob o título: "Une Grande Dame Juive de la Renaissance - Gracia Mendes-Nasi".

Antes, já alguns autores se haviam referido a ela no século XVII e no século XIX, nomeadamente, Meyer Keyserling na sua "História dos Judeus em Portugal", "Geschichte Der Juden in Portugal", publicada em 1867. Mas é sobretudo no século XX que se desenvolvem obras romanescas e estudos históricos dedicados à sua vida e personagem dos quais o grande marco é o livro de Sir Cecil Roth, "Dona Gracia Nasi" publicado em 1948.

"A Senhora" de Catherine Clément (1992)

Foi Alain Oulman (colaborador e herdeiro da editora de livros francesa Calmann-Levy) quem convenceu Catherine Clément a escrever "A Senhora" (1981-1989) . Era uma história que ele conhecia bem, por ser sobrinho de uma mulher que acreditou ser uma reencarnação de Beatriz de Luna.

Quando Alain Oulman lhe pediu que escrevesse a história de Gracia Nasi, ela começou por recusar: «eu sou judia, mas pertenço a outro mundo judeu. O meu avô nasceu em Baku, a minha avó algures na Checoslováquia, encontraram-se em Odessa, morreram em Auschwitz. Foram denunciados por um padre católico, e foi esse ponto que eu senti que tinha em comum com esta história».

Algumas das fontes de Catherine Clément

Catherine Clément refere que o livro de referência sobre a vida de Beatriz Luna é o de Sir Cecil Roth, "Dona Grácia Nasi" (1948), o primeiro volume de uma obra consagrada à casa dos Nasi. E sugere igualmente, entre outros livros, a leitura  do romance "Le Duc de Naxos" de Georges Nizan (1989).

As informações sobre as últimas comunidades marranas provém do filme "Les Derniers Marranes" de Frédéric Brenner e Stan Neumann, difundido em 1990 no canal Sept.


"O Fantasma de Hannah Mendes" ("The Ghost of Hannah Mendes") (1998)

Doña Gracia Mendes (ou Hannah Mendes) tem sido alvo de inúmeros livros, tanto novelas como estudos históricos. A perspectiva da escritora israelo-norte-americana Naomi Ragen é particularmente original: a  busca de um manuscrito perdido em pleno século XX.

A acção decorre em 1996, em Nova Iorque. Este é o lugar onde vive Catherine da Costa, viúva de Carl da Costa, um filho do Rabino Obadia da Costa. Quando Catherine sabe que tem pouco tempo de vida, engendra um plano para que as suas netas, Francesca e Suzanne, que nunca tinham ligado muito à sua ascendência judaica, se interessem pela procura, na Europa, das páginas perdidas de um manuscrito antigo, do século XVI, relatando a história de Hannah Mendes, a sua fuga à Inquisição, bem como a sua falsa, porque compulsiva, conversão ao Cristianismo.

 
"O Judeu de Malta" e "O Mercador de Veneza"

Christopher Marlowe ter-se-à inspirado numa história sobre Joseph Nasi para escrever uma peça sobre um mau negociante judeu que através de artimanhas tinha conseguido enganar os príncipes europeus. Confundiu Chipre com Malta e intitulou a peça de "O Judeu de Malta". Mais tarde William Shakespeare teve conhecimento do Judeu de Malta e transformou Joseph Nasi, duque de Naxos, em Shylock, "O Mercador de Veneza".


Em Portugal

A vice-presidente da comunidade israelita em Portugal, Esther Mucznik, é a autora do livro "Grácia Nasi - a Judia portuguesa do século XVI que desafiou o seu próprio destino" (2010).

Esther Mucznik admite que inicialmente hesitou em escrever sobre Grácia Nasi, visto que já há muitos livros sobre a história desta mulher. A autora explica que escreveu uma biografia baseada nos factos existentes, embora acabe por passar a sua visão de judia portuguesa sobre o assunto.

1 comentário:

Blogger disse...

http://conhecimentodoinferno.blogspot.pt/2008_03_01_archive.html