quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Os portugueses em “A Lenda de Suriyothai“ (Tailândia) (2001)

Teve de acontecer um tsunami na Ásia para que os portugueses regressassem ao Sri Lanka e à Indonésia. Em Galle, apenas ficou de pé o que resta do forte português, e tiveram de ser os habitantes com apelidos como Silva, Sousa e Pereira a relembrar-nos que o nome da cidade vem do facto de os barcos portugueses terem ali chegado ao nascer do Sol, quando os galos cantavam.

Dificilmente se encontrará uma cena mais empolgante para o cinema épico, porém o gigantesco espólio da expansão portuguesa ainda não foi descoberto pelos grandes estúdios. Parece-me que esta devia ser uma prioridade cultural, até porque fomos os primeiros europeus e, durante mais de meio século, os únicos europeus em quase todos os lugares distantes.

Assim, foi uma surpresa gratificante o visionamento do épico A Lenda de Suriyothai, o maior êxito de sempre do cinema tailandês. Francis Ford Coppola deu uma ajudinha na montagem, agilizando a narrativa, mas o realizador, Chatri Cholerm Yukol, fez um trabalho digno e investigou devidamente a história. Para quem se dê ao trabalho de escutar os seus comentários, constatará que a “Peregrinação” de Fernão Mendes Pinto é uma das suas principais fontes, sobretudo nas cenas das batalhas. E mais agradável ainda é ver como a imagem que os tailandeses têm dos portugueses é tão positiva.

Eram mercenários, mercadores, médicos jesuítas, que até trouxeram a varíola, mas estão em todo o lado. Fazem parte das pinturas, das paisagens, dos mapas. Embora poucos, são mais do que os chineses, e aparecem sempre junto aos canhões e espingardas, que estão por todo o lado, nestas guerras entre a Tailândia e a Birmânia. Veja-se com particular interesse os pequenos canhões adaptados ao dorso dos elefantes, os antepassados dos tanques modernos. Não há ali qualquer laivo de interferência ou colonização portuguesa, nem sequer religiosa, apenas nos fica uma enorme saudade por uma época em que o Mundo era jovem e apenas os nossos antepassados eram testemunhas de outros povos. E esta grandeza, só nossa, ninguém nos pode tirar, por muito dela que nos tenhamos esquecido.

De resto, a história reporta-se à heróica rainha Suriyothai, que deu a vida para salvar o marido. (…)

Fonte: Luísa Alves / Docente da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa (Revista Premiere nº 64, Fevereiro de 2005)

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Em 1548, quem reinava no Sião era o rei Maha Chakapat. Seis meses apenas tinham decorrido sobre a sua regência, quando os birmaneses invadiram o seu território. O rei Chakapat, como era sua obrigação, conduziu o exército real ao encontro dos invasores, montado no seu elefante de guerra. Às mulheres não era permitido combater. No entanto, a rainha Suriyothai, imbuída pelo amor ao seu marido, disfarçou-se de homem e igualmente partiu no seu próprio elefante. Durante a batalha, o elefante do rei Chakapat tombou devido às imensas feridas, e o monarca esteve em sério risco de ser morto. No entanto, a corajosa Suriyothai interpôs-se entre o marido e as tropas birmanesas, sendo morta e desta forma, salvando a vida do seu marido. (…)

Uma nota que nos enobrece nesta película (ou talvez não) será a análise incidental à presença portuguesa no Sião, com vários mercenários nossos conterrâneos a combater do lado dos tailandeses e a serem pagos a peso de ouro. O detalhe histórico é extremamente cuidado, e isso nota-se nas suas armaduras e restante armamento, embora nunca seja explorado no sentido de os vermos a falar a nossa língua-mãe, e até ter uma personagem interventiva.

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