terça-feira, 11 de março de 2008

"Madame Souza" a heroína de "Belleville Rendez-Vous" (França, 2003)


 Só num mundo de animação paralelo é que uma velhota portuguesa - Madame Souza - podia ser a heroína de uma longa-metragem. E que longa-metragem! "Belleville Rendez-Vous" passa-se parte numa França parada nos anos 50, e outra parte numa Nova Iorque francófona (...)

Fonte: Eurico de Barros, Diário de Notícias


Um português não pode deixar de ver o filme sem notar que a sua protagonista é nossa compatriota: Madame Souza, uma imigrante de profissão indefinida mas que cumpre o estereótipo parisiense da "concierge" [espécie de porteira] portuguesa. Sei que há gente que se chateia com estas representações, – coisa que nunca consegui perceber. Aqui no caso isto seria duplamente pateta, uma vez que o filme é a mais terna homenagem que já vi à interminável humanidade destas nossas velhinhas que não param quietas.



Mme. Souza poderia também ser uma avó judia, grega ou cabo-verdiana, mas ninguém que veja o filme aqui em Portugal pode deixar de encontrar ali expressões ou atitudes de alguma mulher mais velha da sua família. E quando Mme. Souza atravessa o Oceano à procura do seu neto ao som da Missa em Dó menor de Mozart, Chomet eleva esta pequena e incansável mulher à dimensão épica. Finalmente! Já não era sem tempo da "concierge" portuguesa ter o seu momento de glória nas telas dos cinemas.

Fonte: Rui Tavares (Barnabé)



O cão ladra e o comboio passa. Uma avó atarracada, carrapito ao alto, exibe os tímidos pêlos de um buço. Fica como um espelho da imagem que os portugueses levaram ao mundo. Só quem não notou o galo de Barcelos estampado na toalha de mesa ou o prato onde se lê "Fátima Maria" (detalhe, detalhe) ficará espantado quando, lá mais para a frente, Madame Souza ataca o piano para cantar, tcham-tcham, "Uma Casa Portuguesa".

É uma senhora portuguesa com certeza, mas Madame Souza, a deliciosa protagonista de "Belleville Rendez-Vous", primeira longa-metragem de animação de Sylvain Chomet, até nasceu francesa, como uma evolução a partir da personagem da sua anterior curta-metragem "La Vieille Dame et Les Pigeons" (1998).



[Chomet refere que] "Quando estava em Montreal, Canadá, onde vivi durante dez anos, havia um restaurante que era dirigido por portugueses chamado 'Le Roi du Plateau'. Eu costumava ir lá e tornei-me amigo dos proprietários, o Michel e a Mónica Viegas.

Talvez tenha sido por isso que quis ter uma personagem portuguesa no filme. Creio que fui influenciado por eles. Na verdade, é a voz da Mónica que se ouve na canção e no monólogo inicial. Além disso, andei a ver uns livros à procura de imagens, para ter uma ideia de como a Madame Souza se vestiria, o carrapito, etc.

Em todo o caso, há muitos portugueses em França, são muito identificáveis porque se vestem sempre de escuro." Ah, o estereótipo cultural. Não se preocupem porque, para nós, o inglês de Sylvain Chomet também soa a sotaque de Pepe Le Pew. Além do mais, os "clichés" em "Belleville Rendez-Vous" também não deixam ilesos os franceses, como reconhece Chomet.

Fonte: Kathleen Gomes, Público

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